No futebol, a glória costuma pertencer aos artilheiros. São os gols que viram manchetes, constroem ídolos e ficam eternizados nas memórias dos torcedores. Mas há uma categoria de heróis silenciosos que escrevem sua história impedindo que o gol aconteça. Entre eles, poucos alcançaram o patamar dos lendários goleiros que transformaram a defesa em arte, e um deles, de forma quase sobre-humana, ficou marcado como o goleiro que menos levou gols na história: Mazarópi, brasileiro que defendeu o Vasco nos anos 1970 e 1980.
O nome pode não ser o mais popular da era digital, mas seu feito é praticamente inatingível. Mazarópi ficou 1.816 minutos, o equivalente a mais de 20 partidas, sem sofrer um único gol, entre 1977 e 1978. É o recorde mundial de invencibilidade reconhecido pelo Guinness Book, uma marca que ultrapassa gigantes como Buffon, Cech e Alisson.
A história desse recorde é uma lição sobre consistência, foco e o valor da regularidade no futebol.
A muralha do Vasco
Quando Mazarópi assumiu a meta do Vasco, o clube vivia um dos períodos mais competitivos de sua história. O goleiro, conhecido pela calma e posicionamento impecável, não era o mais espalhafatoso, mas era o mais eficiente.
Durante quase dois meses de jogos oficiais, ele defendeu tudo o que vinha pela frente. Foram 20 partidas consecutivas sem ser vazado, um feito que, mesmo em tempos modernos, parece irreal.
Seu segredo estava no controle. Mazarópi raramente dava rebote, lia as jogadas com antecedência e posicionava-se com perfeição. Jogava com o instinto de quem parecia ver o jogo em câmera lenta.
Enquanto o Vasco se fortalecia defensivamente, ele se transformava no símbolo da confiança da equipe.
O recorde que desafiou o tempo
A marca de 1.816 minutos sem sofrer gols foi alcançada entre 18 de maio de 1977 e 7 de setembro de 1978. Até hoje, nenhum outro goleiro superou essa sequência em competições oficiais.
Para efeito de comparação, Gianluigi Buffon, o ícone italiano da Juventus, manteve sua meta invicta por 974 minutos em 2016, praticamente metade do tempo de Mazarópi. Essa diferença explica por que o recorde do brasileiro é tratado como algo quase sobrenatural.

O feito atravessou gerações e tornou-se referência para arqueiros do mundo inteiro. Mesmo em uma época sem holofotes globais ou redes sociais, Mazarópi entrou para a história com uma marca que sobreviveu a décadas de futebol ofensivo e evoluções táticas.
Goleiros lendários e suas muralhas
Se Mazarópi lidera o ranking de invencibilidade, outros nomes também merecem lugar nessa galeria de muralhas humanas.
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Gianluigi Buffon (Juventus, 2016): 974 minutos sem sofrer gols na Serie A.
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Edwin van der Sar (Manchester United, 2009): 1.311 minutos de invencibilidade na Premier League.
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Dida (Milan, 2004–05): referência brasileira na Europa, com 10 jogos seguidos sem ser vazado na Champions League.
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Alisson Becker (Liverpool, 2019): eleito o melhor goleiro do mundo, símbolo da nova geração de goleiros completos.
Esses nomes mostram que, apesar das mudanças no futebol, a essência da posição permanece: a busca pela perfeição defensiva.
O valor de quem impede o gol
Ser goleiro é viver no limite do erro. Um atacante pode perder dez chances e ainda ser herói se marcar o gol da vitória. Um goleiro, por outro lado, pode fazer dez defesas e ser lembrado apenas pela única bola que entrou.
Por isso, marcas como a de Mazarópi representam mais do que estatísticas: são monumentos à paciência, à disciplina e ao controle emocional.
O goleiro que toma menos gols não é apenas aquele que tem reflexos apurados, mas aquele que domina o tempo, que transforma pressão em silêncio e que faz da solidão uma fortaleza.
O legado de uma muralha eterna
Décadas depois, o recorde de Mazarópi segue intocado, resistindo às novas gerações e aos novos estilos de jogo. Sua história é lembrada como a prova de que a grandeza também mora na discrição.
Enquanto os artilheiros celebram seus gols, ele permanece como o símbolo do oposto, o homem que fez da ausência de gols sua maior obra.
No fim das contas, o futebol é feito tanto de quem marca quanto de quem impede. E Mazarópi, o goleiro que menos levou gols na história, nos lembra que a defesa perfeita também pode ser uma forma de arte.





